Porque as bizarrices cotidianas devem ser comentadas

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Choque anafilático

Hoje eu vi uma foto do nosso sambista alcoólico tomando uma aguinha



Isso me fez lembrar do dia em que eu mesma resolvi desafiar a morte e tive que dribla-la por diversas vezes durante as 24 horas subsequentes. Porque vocês nem imaginam a lista quase infinita de perigos com os quais podemos nos deparar ao ingerir míseros 500 ml de água, este veneno.

Estava eu derretendo sob o sol da Bahia durante uma de minhas temporadas no além rio. Como o relógio ainda não tinha batido 11h00, decidi inovar pedindo uma água para o garçom. Sei que é proibido, sei que não devemos, mas pensei que àquele horário esse deslize passaria desapercebido. Na cena fictícia que criei mentalmente, eu bem notava reprovação no semblante do homem. Parece que ouvi um "a vida é sua, não é minha mesmo" ao fundo, mas nem parei para concatenar. Mal sabia onde acabara de me enfiar.

Porque a verdade é uma só: quem, em sã consciência, pega um táxi, um avião, uma balsa, um carro, uma canoa, uma charrete e um jegue pra chegar no destino final e beber água? Não faz sentido, sejamos lúcidos.

Mas foi dar o primeiro gole no líquido ali, na praia de Caraíva, para ouvir a profecia "ÁGUA, SCARCELLI?? ISSO NÃO VAI TE FAZER MAL NÃO, Ô?" - berrou Octávio enquanto passava correndo desabalado pela areia.

Confesso que aquilo me assustou, pois Octávio é alguém que sabe o que diz e isso fica muito nítido se observarmos nossa imagem oficial daquele verão:

"Paula e Octávio em: bico na garrafa"
Né? É. Se tem uma coisa CLARA aqui é o fato de realmente não pensarmos que cachaça é água, essas coisas todas. A gente sabe bem o que deve ou não ser consumido, alguma dúvida? Nenhuma.

Tudo transcorreu normalmente. Passei o dia na praia, no jantar comi um estrogonofe de arraia que só a Fátima sabe fazer e depois emendei a noite na calçada da fama em frente à Busca Vida me alcoolizando como se aquela fosse minha última chance. Uma aranha louca pulou e mim e tomei uma picada. Bebi mais e no fim de tudo ainda devo ter comido um kibe do Neres, pois é assim que determina o protocolo. Fui feliz para sempre.

No dia seguinte, acordei um pouco antes do meio dia e quase tive um colapso ao ver minha imagem no espelho, pois eu parecia um tomate de biquini. Pensa numa pessoa VERMELHA cuja goela fecharia em 15 minutos no máximo e eu já estava até procurando uma caneta Bic para não morrer sufocada.

Sentei no belo gramado que separa o meu quarto da praia e aí começou minha luta pela vida, já que a primeira providência tomada por Fabio, o anfitrião, foi abrir uma garrafa de álcool Zulu e jogar sobre mim. Inteira. Ali no meio daquela gente toda acendendo cigarros, charutos, cachimbos e similares em pleno vendaval baiano. Berrei "NINGUÉM ACENDE MAIS NADA, NEM A LUZ"  e saí correndo. Segundo Fábio, aquilo era alergia à areia (oi?) e só o banho de álcool salvaria. Sei. Como já foi comentado, saí correndo. Tomei uma ducha e o caminho da farmácia também.

Antes de chegar lá, encontrei com Dante. Diagnóstico: alergia a arraia. Importante comentar que Dante é nosso grande guru e o que ele falar, falado está. Mandou eu me besuntar de sua famosa e exclusiva pomada francesa caríssima e tomar um antialérgico. Okay, maravilha, eu já estava indo pra farmácia mesmo, né.

Nosso farmacêutico, Raimundo, contestou o parecer de Dante, assim como o de Fabio. De acordo com ele, aquilo era alergia à picada da aranha louca. Ele concordava com o banho de álcool, com a pomada francesa e com os antialérgicos, porém, acrescentou a seguinte orientação na posologia:

"Tome dois. De uma vez. Mas tome com cerveja porque assim você pótencializa o efeito"

Beleza, vamos tomar Polaramine com cerveja para pótencializar.

Quando minha irmã viu a cena, quase me matou. Tentei explicar que era desperdício de energia, pois morreria de qualquer forma, fosse pela ingestão de medicamentos com álcool, fosse por uma glote fechada ou ainda mesmo vítima de um incêndio acidental.

Não morri e nunca mais tive alergia a nada. Continuo comendo arraia, convivendo com aranhas baianas mutantes e chafurdando na areia, apesar de ter parado totalmente com a água.

Tirem suas próprias conclusões. Beijos.

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